domingo, 27 de junho de 2010

O FOGO


O que arde dentro de mim…

Tudo o que eu tenho, tudo o que eu sou … arde dentro de mim.

Tudo o que arde dentro de mim não me destrói.

Purifica o corrompido. Lava e esfrega, penteia e acende.

Acendo mais um cigarro com o teu fogo, menina, coberto de espirais.

Quase púrpuras, Não és de cá por violeta que fosses. Mas eu conheço-te!

Torna-me inédito o incêndio que te provoco e … por pura casualidade, dá-me de volta a origem do meu ser. O seu estado normal.

Mas, olha … perguntei por ti.

Chamei-te.

Em lume brando, de chama viva, agonizei os meus próprios dias.

Por isso me revoltei e me esfreguei nú no chão impuro. E depois me incendiei.

Fogo. Fogo. Vastas centenas de almas que ardem por negócios … tão simples e tão encantadores como o amor.

Devia ter-te dito que viajei com uma centelha. Olha, fui indo, fluindo como a história que te conto. Aos poucos.

Penetrei na rebeldia, na crueldade, participei na paixão, na traição. Vivi tudo em desespero.

Ainda não regressei.

São mais as palavras que me ferem. Que apagam o meu fogo.

Tu tens a chama que eles querem negociar. Querem ferir.

Aproximam-se. Tu vês? Mas será que tu não os vês? Não percebes que são bocados já de mim que eles transportam naquelas malas vazias de ti?

Abriga-te menina.

Espera por mim.

Ouve os meus passos atrás de ti e não olhes para mim.

Estamos no fim dos nossos dias.

Mas aguenta-te. Tudo arderá, tudo se purificará. Até a água voltará a ser clara, límpida e poderemos beber dela.

O que eles têm hoje são os restos do passado, os estilhaços da sua própria experiência ou de uma sabedoria maltratada.

Urge a vingança.

Tu… dás-me uma mão.

Obrigado menina.

Tu tens isso. O beijo do passarinho. A caravana das coisas que tu guardas.

Tu tens a candura, o gesto da verdade e a pureza. És limpa. Branca. Mas precisas, não da mão mas de um fogo ardente que devasse e trespasse o teu presépio de menina e te devolva a integridade das coisas que tu guardas.

Dou mais voltas na cama. Acendo um cigarro, a luz, abro um livro…

“that song we played, when we fell in love for the first time. When we fell out of love and when we fell in love again. The essence of what we once were and will aways be … free!”

Fito absorto um retrato de um carro azul bebé que está pendurado na parede. Tudo o resto é preto e branco, como o Hotel onde estive em Beirute.

Peguei em roupas, abri gavetas e fiz as malas.

Nessa noite embarquei num eclipse que me deixou sozinho.

Acendia enquanto esperava os fósforos. Comentava com a chama os desagrados das coisas e das pessoas que se agarram às coisas.

Passado um bocado, passou-se tempo, estava agarrado a uma cadeira.

Pus fogo à cadeira, à mesa, às cortinas, ao Hotel de Beirute. Pus fogo ao País, às pessoas. Pus fogo às coisas, aos livros, às escolas, aos Estados, às nações. Pus fogo aos serviços e às instituições. Pus fogo ao Mundo.

Deixei a água mais branca e bebi dela.

Fui-te buscar ao abrigo.

Nessa noite de luz imensa, e enquanto o mundo ardia, embarcámos num voo que nos deixou completamente limpos e construímos tudo o que arde de mim para te dar a ti.

1 comentário:

Anónimo disse...

O que alteras de 27 de Junho de 2010 a hoje, 2 de Junho de 2011?
Texto de ti, sobre ti, para ti, sobre tudo o que passa e imaginas que passa por ti.
Belissima a leitura.
Obrigada.