A Terra
- A Terra -
No amanhecer daquela aldeia cândida, havia algo diferente do comum dos lugares por onde já passei, vendo o Sol nascer…
Parecia que quando nascia o dia, nascia novamente a aldeia, acordada na
realidade de um sonho mágico e mimoso. Perfumado. Limpo.
A aldeia acordava e nascia com o Sol. Fizera as pazes com o tempo. E acordava fresca, limpa, branca.
O cheiro das casas de aldeia sempre me fascinou. É uma mistura de
bolachas, com alfazema, rendas e antiguidades. Uma casa de aldeia, que é
uma simples casa do campo, tem que ser simples e modesta. Esse é o seu
uniforme. Tem que haver velharias de encantar que nos façam recuar aos
tempos das grandes convulsões, das guerras, da época da fome e da
miséria – de que já ninguém se lembra.
Tem que haver poucos
objectos ornamentais, supérfluos e nenhum lixo “industrial de matriz
urbana” pseudo-estilizado. A simplicidade, o branco, o limpo, a
paisagem, a água é a combinação perfeita para nos embalar numa perfeita
calma possível.
Muitos paninhos de linho, rendas, fruta madura,
cheirosa a fazer-se cúmplice ao sorrateiro bater das horas do relógio de
parede. E aquela caixinha de música no quarto de costura que segundo
parece até veio do Brasil.
Está na hora de tomar banho para ir lá
para for a aproveitar um bom pequeno almoço. Da casa de banho branca,
com muitas plantas fixadas nos peitoris das janelas eu vejo o ribeiro
que atravessa os quintais e os terrenos da casa, banhando com delicia e
muito mimo os agriões, os trevos e a hortelã.
Lá ao fundo vêem-se as
tangerinas, Pequenitas, pois sim, mas doces como mel. Ao lado as
pereiras e as cerejeiras. Descansam penduradas enquanto a árvore doseia o
alimento pelos seus frutos, apurando o seu fantástico aroma..
Depois de ter tomado um bom banho de água mais fria que quente,
enrolei-me numa enorme toalha turca, branca e vesti uma roupa fresca a
cheirar a sabão de barra.
No exterior da casa, junto ao jardim que
embeleza a soleira e a escadaria da porta principal e debaixo das
arcadas, tomei um sumo de tangerinas, duas torradas com mel e ouvia
atentamente o canto oferecido de um pardal apaixonado a um estorninho
muito amigo nos campos lavrados, nos jardins com perfume de romã daquela
casa, naquela aldeia que lá vai…
João Carlos Lages - 1996
Sem comentários:
Enviar um comentário